Nem tão doce retorno

Aterrissando na terrinha, saudosa Porto Alegre, ainda não completamente recuperada do impacto da volta. Tentei viver o último mês como se fosse uma estudante em Paris, e não uma empresária trabalhando à distância.
 
Não foi fácil, mas teve momentos divertidos. Peguei 200 euros no caixa e tentei viver com este valor por quase um mês. Apesar do supermercado na Europa ser mais barato que o brasileiro, com essa retirada não dá pra comer em restaurante francês, e nem ir muito ao cinema, que custa 25 reais a sessão. Mas existem concertos de graça em muitas igrejas, exposições gratuitas e, no primeiro domingo do mês, todos os museus nacionais têm entrada franca.

Do que eu mais estou sentido falta? Da comida muitíssimo bem elaborada, dos vinhos sem nenhuma acidez e dos pães divinos. Mas onde reside a maior e mais importante diferença neste retorno? Na questão da violência. Aqui no Brasil não posso caminhar à noite, e mesmo durante o dia é complicado. Na última semana, minha filha de 14 anos foi assaltada indo para o colégio, por um ladrão rápido que levou seu celular, mas não quis os 5 reais que ela disse portar. Pensei: o celular era velho e, ainda bem, não foi um sequestro relâmpago. Que sociedade é esta que tem o direito de amedrontar uma adolescente feliz? São tristes situações frequentes como essa , sem nenhuma solução visível. Em outra ocasião, minha filha mais velha já tinha se livrado de uma tentativa de ser arrastada por dois ladrões para o Parque Farroupilha, onde eu mesma já fui quase asfixiada por um homem que tentou me levar pelo pescoço para perto dos barquinhos, às 7h30 da manhã. Não dá para aceitar. É ruim demais.
 
Pior só receber a notícia que o marido de uma amiga foi assassinado numa praia em Santa Catarina por dois viciados em crack que queriam 20 reais. Onde está a causa maior dessa brutalidade ? No capitalismo selvagem mundial, principalmente no norte-americano e no europeu, pivôs da globalização, comandando o dinheiro virtual, que vai todo para a Inglaterra, Suíça, ilhas Cayman, Marte. Valores que nunca descem para circular entre a população carente, moedas que estão fazendo falta total aqui em baixo. É tão óbvio que é insuficiente a verba disponível para os projetos sociais, para a educação, para a melhoria de vida dos mais carentes, para não terem que roubar o celular de uma menina para comprar comida ou droga. Quem tem uma aplicação no banco deveria saber o que é feito com seu depósito. Ele vai ser usado no Brasil ou vai ser mandado para algum paraíso fiscal, por grupos econômicos cada vez mais unidos e poderosos? Todos só querem saber dos dividendos das aplicações, para gerar mais riqueza, mais números que não chegam nas carteiras dos comuns. Este sistema econômico já faz tempo que está socialmente falido e piora a olhos vistos .
 
A classe média também não fica pra trás. Tem que ser toda reeducada e reprogramada. Tu caminha nas ruas de “comércio forte” de Paris, vendo lojas com preços ridículos de tão altos, com massas de turistas comprando artigos de marcas de luxo. Com que intenção exatamente? Para que ter uma bolsa horrorosa com um LV aparente? Pega uma criança para criar e gasta esse valor em fralda e mamadeira. Compra artigos da feira , que não paga intermediário, e colabora para a manutenção do pequeno comerciante rural, melhorando a condição do agricultor, tão necessário no campo. Dá vontade de gritar nas consumistas e populosas ruas de Paris: “Façam hoje algum ato eficiente para o futuro da humanidade”.
 
Pior que a questão econômica, somente a ecológica. Os desastres com o petróleo são corriqueiros. As indústrias e as pessoas estão acabando com os nossos mares, espécies, geleiras, florestas e solos de uma forma extrema, rápida e eficiente. As previsões de catástrofes climáticas são até otimistas com essa devastação acelerada. O mesmo desenvolvimento que as novas tecnologias de comunicação estão apresentando tem que se estender para o combate aos efeitos do aquecimento, como inundações, secas, ciclones e devastação das espécies. A África, agora sede da copa, tem que ter uma atenção especial do mundo todo. Trabalhadores africanos ganham 100 reais anuais para trabalhar em lavouras multinacionais que destroem totalmente seus solos, e suas colheitas são levadas direto para o consumo no exterior. Agricultores incansáveis, que ainda por cima são cobaias de teste para medicamentos. O mundo tem que respeitar os africanos. Os estrangeiros têm que ser presos e obrigados a pagar altas indenizações se realizarem turismo sexual envolvendo menores na África, no Brasil ou em qualquer ilha asiática carente. Em suma, enche a paciência ver tanta acomodação dos governos, tanta avidez e tanto descuido com a natureza. A discussão das soluções é lenta, e a destruição, acelerada.
 
Porto Alegre continua úmida e fria nesta época do ano, mas a luz da cidade é incomparável. Vou aproveitar um pouco do sol ,comendo banana de verdade, manga doce e tomando água de côco, pois isto não tem na Europa.
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