Festa em Casa

Hoje é o dia da festa da Casa de Cinema de Porto Alegre. Acontece sempre na mesma data (com raríssimas exceções): 22 de dezembro, que foi o dia da primeira festa, em 1987, realizada na nossa primeira sede, na rua Lageado. O saldo daquela festa foi tão positivo que, nos dois anos seguintes, repetimos a receita. Mas, na terceira, em 1989, a super-lotação de todos os ambientes cobrou seu preço: um monte de gente dormindo no chão (não conseguiram ir embora, tal o estado etílico da turminha); quase todo o piso da sala, de parquê, fora do lugar, devido à intensidade geral da dança; e a pia da cozinha quebrada (reza a lenda que o Wander sentou em cima e tudo desabou, mas não há testemunhas fidedignas do fato). Enfim, foi uma grande festa, que levou os 13 sócios (sim, éramos um bando) a tomarem duas decisões. A primeira: enquanto houver Casa de Cinema, haverá a festa da Casa. E a segunda: nunca mais fazer a festa dentro da Casa. Éramos sábios.

A festa então passou a acontecer em outros lugares. Talvez o mais legal de todos tenha sido o Clube Vasco da Gama, na beira do Guaíba. Um galpão de madeira, com o piso meio solto. Quando a pista enchia, o salão inteiro vibrava e a agulha do toca-discos (lembrem, estamos no começo dos anos 90) começava a pular. Chegar no Vasco da Gama era uma pequena aventura: passar em baixo da ponte, driblar as enormes poças d’água quando chovia, e, principalmente, encontrar o caminho de volta às cinco da manhã. Tem gente que pensou estar chegando em casa e estava chegando em Tramandaí.

Depois de cinco edições, o Vasco da Gama foi reformado e passamos para um clube ao lado, o GPA, que tinha um piso mais estável e uma imensa sacada, de onde assistíamos aos aviões chegando em Porto Alegre a poucos metros acima de nossas cabeças. Esses aviões traziam dezenas de amigos que moravam em outros estados e marcavam encontro na festa da Casa pra botar a conversa em dia. Essa tradição continua, mesmo que em menor escala. Ficamos todos mais velhos, mais distantes, mais preguiçosos. Mas esse ano espero encontrar pelo menos uma dúzia de gaúchos desterrados.

Quando cansamos do GPA, tivemos algumas edições (Giba, por favor, faz uma revisão histórica desse texto) no SAVA Clube e na Sociedade de Engenharia. Eram lugares interessantes, com boas pistas de dança e jardins grandes para as pessoas conversarem, ou fazerem suas loucuras em paz. Finalmente, passamos para o endereço atual, o bar Ocidente, do nosso amigo e super colaborador da Casa de Cinema, Fiapo Barth. A grande vantagem do Ocidente é que ele já tem uma estrutura preparada para um evento como a nossa festa. Estamos mais velhos e mais preguiçosos (estou me repetindo, sei bem).

Mas certas coisas não mudaram: eu, a Luli e o Jorge costumamos botar som por algum tempo, e depois um DJ profissional assume. Já passaram pela festa Mauro Borba, Katia Suman, Jimi Joe (acho que o DJ com maior número de participações), Flu, Marcelo Ferla, Diego de Godoy e muitos outros. Agora é a vez dos jovens: Júlia Barth (no ano passado) e Bruno Suman (este ano). Não há identidade musical. É quase um caos musical: eu (Capitão Vortex) boto rock velho, música eletrônica, soul e Shabba Ranks (toquei “Mr. Loverman” em todas as festas, e hoje vou tocar de novo); a Luli (Miss Sequelinha) bota rock contemporâneo barulhento; o Jorge (Dr. Furtado) toca rock, samba (sim, ela já botou Ivete Sangalo e nem ficou envergonhado) e outras esquisitices. Cada DJ tem seus fãs e seus detratores. Lá pelas 4 da manhã, pra expulsar os últimos convidados, eu costumo voltar e tocar um set de punk-rock. E aí os dez sobreviventes resolvem se animar…

Não sei como vai ser a festa de hoje. Quer dizer, algumas coisas eu sei: o Dudu Guimarães (de corpo presente ou em espírito) será o primeiro a chegar; os seis sócios vão brindar com champanha no começo da festa; o Giba vai reclamar que a música está muito alta, e ele não consegue conversar; a Luli vai botar uma música e trocar 20 segundos depois; o Jorge vai tocar Tim Maia; a Ana e a Nora vão resolver alguns problemas na portaria (“Quem é esse sujeito que quer entrar e ninguém conhece?”) e depois esquecer que existe uma portaria; a salinha do Fiapo vai ficar cheia; a champanha vai acabar cedo demais; a cerveja vai acabar tarde demais; alguém vai botar “Dancing Queen”, a Gorda vai se animar, e a pista vai encher; alguns casamentos vão acabar; alguns casamentos vão começar; alguns convidados vão dizer que a festa não é mais aquela, que tá chata, que só tem velho; outros convidados vão reclamar da música, do calor, da pouca champanha e que a Casa de Cinema é uma panelinha que não dá espaço para as novas gerações; e algumas pessoas terão um violento “dejà-vu”, vão se lembrar das festas no Vasco da Gama, vão se emocionar e, relevando o fato de que estamos todos com certeza mais velhos, mais distantes e mais preguiçosos, vão dançar um pouco mais, estender a noite um pouco mais, conversar, abraçar e beijar um pouco mais e desejar mais um feliz ano novo. De novo. Pela vigésima quarta vez. E ano que vem tem mais.

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