Como eram lindas as praias catarinenses

Aos meus fiéis leitores, que reclamaram da minha ausência no blog, queria dizer que primeiro trabalhei demais, depois tirei férias de verdade. Hoje, depois de escrever uma carta comercial, senti que tinha destravado. Outra questão: o Facebook supre a tua necessidade de comunicação com as massas. E mais uma: acho que às vezes não tenho nada de interessante a dizer e é melhor ficar quieta, pois não gosto de jogar conversa fora. Tenho a maior facilidade de escrever em viagens, fora de casa e longe do escritório. Para mim, não existe nada mais inspirador que viagens. Vou relatar apenas o meu primeiro dia de férias, que dá um curta-metragem.

Praia catarinense, domingo, casa cheia de parentes, sol. Acordamos, eu e meu marido, às 6 horas da manhã, antes de todos, para montar um toldo para 10 pessoas na beira do mar, pois ainda era janeiro, e os catarinenses, argentinos e paulistas ainda estavam em férias, o que significa muita gente na praia. Na casa, havia duas crianças pequenas dormindo, que são muito branquinhas e iam precisar de muita sombra.

Faz mais de 20 anos que veraneio nesta praia. Chegamos na areia vazia e escolhemos um lugar onde não havia ninguém num raio de 500 metros, onde normalmente nos instalamos. Fizemos relaxamento e montamos o toldo em 40 minutos, porque os ferros são um pouco complicados. Suados, fomos para dentro do maravilhoso mar, com a sensação de um mini-Caribe.

Ao sair do mar, uma voz interior me disse: “ Não, vocês não estão no Caribe. É Santa Catarina.” Ao lado de nosso toldo, havia um rapaz de uns 30 anos examinando a estrutura e as cadeiras . Quando chegamos perto, ele falou:

– Oi, pessoal. Desculpa mas vocês vão ter que tirar este toldo daqui porque este é o lugar do meu bar, que vou montar agora. Eu ajudo vocês a montarem em outro lugar.

– Nós ficamos um tempão montando e está bem firme. Bota um pouco mais adiante. Não tem ninguém na praia. Nossas sobrinhas já vão chegar.

– Nada feito. Eu paguei por este lugar na prefeitura e ele é meu. Tenho a licença.

– Nós pagamos um IPTU caríssimo também para estar aqui. Tu tem um mapa de localização nesta licença dizendo a metragem?

– Não, mas eu combinei que é aqui a localização com o fiscal da prefeitura – respondeu, já bem irritado.

– Nada feito. Se não tem a metragem, não temos que sair. Tu tem a praia toda para ti.

Neste momento, o cara teve a coragem de colocar grandes placas de metal de uma cerveja vagabunda dentro do toldo, na frente da minha cadeira. A partir deste momento, ao invés de ver o mar, eu via uma chapa de metal amarela, que circundava todo o toldo. E foi aí que eu perdi realmente a paciência, o que é raro de acontecer.

– Cara, eu não estou acreditando que tu tá fazendo isto. É melhor tu tirar esta placa daqui.

– É melhor tu sair daqui, que este lugar é meu desde o começo do veraneio. Eu vou chamar o fiscal da prefeitura para te expulsar daqui.

– Pode chamar. Estes teus métodos são do Morro do Alemão. Eu não vou sair daqui.

– Tá me chamando de marginal? Eu deveria era te dar uns tapas.

– Além de invadir o lugar dos outros , tu também bate em mulher?

Baixaria rolando, agora eu tinha conseguido enervar completamente o cara , que bufava até pelas orelhas.

Apareceram dois veranistas ogros, muito feios e muito fortes , que compravam cachaça deste vendedor . Eles disseram pro cara:

Você quer ajuda para tirar estes dois daqui? Podemos armar o maior barraco. E já foram gritando para toda a praia e apontando para o meu marido, que tinha tentado argumentar serenamente com o cara:

– Este otário aqui está impedindo um cidadão respeitável de abrir seu bar e trabalhar livremente.

O outro atendente do barzinho disse:

– E este sotaque dela? Ela nem é daqui.

– Rascista! – chamei.

Calculei o tamanho do Shrek 1 e do Shrek 2 e vi, que se o caso fosse engrossar, ou eu acertava exatamente a jugular deles, ou seria sacanagem eu deixar meu marido se envolver com eles, pois, além de totalmente pacifista, ele é magro. Mesmo assim, não tá morto quem peleia. Um dos Shreks tentou pegar no toldo para trocar de lugar e eu disse, glacial:

– Não toca neste toldo.

Ele parou na mesma hora, e o dono do bar disse: – Não mexe no toldo dela Espera o fiscal. E começou a tirar as chapas de metal. O Shrek 2 disse: – Não faz isto. E colocou de volta as chapas dentro do toldo para não perder o terreno. Neste momento começou a chegar a minha família para a sombra, não entendendo nada do que se passava e também o técnico da prefeitura, um guri magrela, se fazendo de importante.

– A senhora vai ter que ceder o seu lugar ao bar.

– Por que, exatamente? A prefeitura deveria ter marcado os locais, se alugou para ambulantes. Faz 20 anos que venho aqui e nunca via nada semelhante acontecer. O pessoal do caldo de cana e da água de coco sempre vai onde tem lugar para a barraca deles.

Neste meio tempo, quando eu estava sentada no meio da propaganda de cerveja, vem uma senhora e pergunta:

– Tem água mineral?

– Não , minha senhora, respondi. Pensei: Legal, deixaram de vender .

O cara disse:

– Viu, seu fiscal? Ela está atrapalhando meu comércio. Acho melhor chamar a polícia.

– Se a senhora não levantar agora , vou ter que chamar a polícia, disse o fiscal.

Pode chamar a polícia, o papa, quem o senhor quiser, que não vou levantar daqui.

Depois de meia hora, chega um brigadiano catarinense, com um 38 na cintura. Por sorte, as crianças também haviam chegado e uma já estava no meu colo, o que sempre atenua a situação.

– Acho melhor a senhora sair porque ele está trabalhando e a senhora é veranista.

– Exatamente por isto que eu não tenho que sair, pois é o meu primeiro dia de férias, depois de ter trabalhado 6 meses sem final de semana. Pago IPTU e tenho o direito de estar exatamente aqui onde estou. Esta situação é completamente absurda. Um abuso.

O dono do barzinho disse:

– Eu tentei ser legal com eles, mas eles não quiseram tirar o toldo. Ela ainda me chamou de marginal.

Apontei para os ogros e disse:

– Estes dois tentaram nos intimidar.

Os dois fizeram cara de rogados para o policial. O brigadiano disse:

– Os dois têm razão. Se ninguém abrir mão, vamos ter que ir na delegacia lavrar a ocorrência.

– A menor chance de eu ir na delegacia – falei. – Nós chegamos primeiro.

O brigadiano disse:

– Então vamos trocar o lugar de seu toldo. Todo mundo ajuda aqui, a senhora não precisa fazer nada.

Para não expor mais ainda meu companheiro, deixei que trocassem o toldo de lugar, o que provocou o amolecimento das amarras. O forte vento que levantou só não levou o pano porque meu cunhado amarrou com cordinhas as laterais. Fiz o técnico da prefeitura ajudar na remontagem A veranista que queria a água disse:

– A senhora não devia ter permitido que tirassem seu toldo. É um desrespeito.

A essa altura, ficou difícil curtir muito o domingo, mas depois deste vieram muitos e muitos dias sem barzinho, fiscal, brigadiano e com pouquíssima gente na praia. No final do veraneio, o mais apavorante: espuma amarelada de poluição depois da rebentação e na ilha onde sempre nadamos. As águas das praias catarinenses estão se destruindo numa velocidade alucinante. São muitas construções, péssimo saneamento, gente demais nas praias, dentro d´agua, mas principalmente nos banheiros e nas cozinhas. Aproveite enquanto puder.
 

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