Viva a TV!

Estou preparando minhas aulas para o curso “Cinema Expandido”, uma Especialização coordenada pela professora Maria Henriqueta Satt na FAMECOS-PUCRS, e isso tem me levado a refletir sobre o que a TV tem de melhor: as séries. Confesso que vejo pouca televisão ao vivo. A última novela que acompanhei com algum interesse foi “Estúpido cupido”. E, antes dela, “Redenção”. Tudo bem, sem problemas, estou mesmo ficando velho, ao contrário da Regina Duarte. Ainda vejo bastante futebol e alguns telejornais, mas a internet é uma máquina de informar poderosa e onipresente, que vai ocupando cada vez mais espaço no meu cotidiano. Isso não significa, contudo, que não esteja assistindo a produtos feitos para a TV, especialmente os que saem em DVD. E os lançamentos das séries estão crescendo em quantidade e qualidade.

 

Tenho orgulho de ter trabalhado como roteirista em algumas séries da Globo, como “Memorial de Maria Moura”, “Engraçadinha”, “Decamerão” e “Luna Caliente” (as três primeiras já lançadas em DVD, as duas últimas produzidas aqui no Rio Grande do Sul). Acho engraçado quando alguém diz que cinema e TV são duas linguagens diferentes. Para escrever estas séries, nem eu, nem meus colegas roteiristas que aprenderam o que sabem fazendo filmes, tivemos que passar por um curso de reciclagem linguística. A estruturação seriada exige uma planejamento a longo prazo, o espectador de TV é menos concentrado e a velocidade de realização costuma ser alta, mas estes são elementos que potencialmente modificam a narrativa, a forma de contar a história, e não a linguagem propriamente dita. Por isso, não vejo problema nenhum em dizer: algumas séries de TV têm evidentes méritos cinematográficos, ou seja, se inserem tranquilamente nas melhores tradições da tecnologia inventada pelos Lumière e da linguagem desenvolvida por Méliès, Griffith e tantos outros.

 

No “Cinema Expandido” pretendo refletir sobre as razões do sucesso planetário de produtos como “Friends” e, principalmente, falar sobre minhas séries favoritas. A mais recente chama-se “Breaking Bad”. O argumento é simples: professor de Química no ensino médio, ao saber que tem câncer e que seu tratamento vai sugar todas as economias da família, decide usar seus conhecimentos científicos para fabricar drogas e ganhar dinheiro. Muito bem roteirizada, excepcionalmente bem filmada e com um elenco de primeira, “Breaking bad” parece um filme – e é melhor que muito longa-metragem que ganhou Oscar. A atuação de Bryan Cranston como o professor é uma aula de interpretação. Contido, mas com uma força dramática impressionante, Cranston vive um personagem hamletiano, em permanente dilema moral com sua família, enquanto administra sua relação com o jovem traficante que o ajuda a fabricar e a vender a metanfetamina. Vi toda a primeira temporada e estou no meio da segunda. Espero que haja uma terceira.

 

Vou comparar a estrutura de “Breaking bad” com outras séries de primeira qualidade, como “Band of brothers” (com sua base documental da Segunda Guerra), “Roma” (com sua fantástica investigação sociológica do Império Romano) e “Big Bang Theory” (com sua notável economia de recursos, o que não impede uma hiperinflação de boas piadas). Pretendo lembrar a importância de “Twin Peaks”, que estabeleceu, com seu padrão narrativo sofisticado, um novo patamar para as séries de TV. E pretendo ouvir os alunos sobre uma série que, tenho certeza, eles devem conhecer bem melhor do que eu: “Lost”.

 

Enfim, vamos falar de um produto audiovisual que, de certa forma, absorveu do cinema uma narrativa menos linear e mais ousada, ao mesmo tempo que segue algumas leis invariáveis da televisão. Enquanto esperamos a inevitável convergência das mídias, é interessante notar como alguns produtos audiovisuais são interessantes justamente porque surgem de misturas, de miscigenações, de trocas de genes midiáticos atuais. A internet é ótima, mas sua força está na diversidade de formas estéticas, na pluralidade de suas manifestações. A convergência, espero, não impedirá essa renovação. A TV está morta. Viva a TV!

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