Como o ECAD vê os filmes: uma “mera sincronização”

Tenho duas observações sobre o texto do ECAD publicado em resposta ao post do Jorge Furtado sobre a atual Lei dos Direitos Autorais. Diz Gloria Braga, Superintendente Executiva do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – ECAD:
 
“No caso específico da proteção às obras audiovisuais, bem como de suas trilhas sonoras, podemos citar inúmeras leis dos mais diversos países do mundo, tais como Argentina, México, Espanha, França, Itália, que protegem, tal qual a lei brasileira, o direito dos compositores das músicas inseridas nas trilhas sonoras dos filmes. E protegem tais direitos, quer os decorrentes da mera sincronização (o grifo é meu), quer os chamados direitos de execução pública musical, gerados quando os filmes são exibidos em cinemas, TVs, TVs por assinatura, ou onde quer que um terceiro, alheio à produção originária do audiovisual, dele se utiliza, muitas vezes, vendendo ingressos ou expressivas cotas de publicidade.”
 
(1) Eu digo:
O que o ECAD chama de “mera sincronização” é a concretização do trabalho de dezenas – às vezes centenas – de pessoas que fazem um filme. Na montagem de um filme, ao mesmo tempo em que são sincronizadas as músicas, são sincronizados os trabalhos de todo o elenco, do fotógrafo (e de sua equipe) e do diretor de arte (e de sua equipe), tudo isso graças ao trabalho do montador (e de sua equipe). Sem a sincronização de todos esses esforços – que viram imagens e sons combinados através da linguagem cinematográfica – não há filme. Interessante que todas essas pessoas, que, na linha de pensamento do ECAD, devem ser “meros não-autores” (atores, atrizes, fotógrafo, diretor de arte) são pagos EXCLUSIVAMENTE pela “mera sincronização”. E nada têm a receber quando o filme é exibido.
 
Também diz a Superintendente Executiva do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – ECAD:
“Razoável que as legislações dos países civilizados protejam, também nessas relações, todos os envolvidos contra princípios nocivos à vida social, quais sejam, o enriquecimento sem causa ou mesmo a usurpação do trabalho alheio. Ora, se um filme pode ser explorado por aqueles que não o criaram por muitos e muitos anos após o seu lançamento (e esse prazo de proteção varia de país para país), natural que seus criadores usufruam os proventos eventualmente gerados! E nesse particular, as leis protegem, em geral, diretor, argumentista, compositor, produtores, artistas, roteiristas, enfim, todos aqueles que contribuíram com suas criações individuais para o nascimento de uma nova obra, e não apenas os compositores e músicos (o grifo é meu).”
 
(2) Eu digo:
Se o ECAD acha que “todos aqueles que contribuíram com suas criações individuais para o nascimento de uma obra” devem ser protegidos, certamente o ECAD apoia uma ampla reformulação da Lei dos Direitos Autorais, que exclui inúmeras categorias profissionais. Por que montadores, atores, fotógrafos e diretores de arte não são autores, e os músicos são? É simples: porque uma lei absurda diz que eles são (e exclui os outros).
 
Mas o surrealismo completo da atual situação é o seguinte: os músicos, representados pelo ECAD estão – teoricamente, se os repasses são feitos – recebendo 2,5% da renda bruta das salas, enquanto OS DEMAIS AUTORES AMPARADOS PELA LEI ATUAL (ROTEIRISTAS E DIRETORES) NÃO RECEBEM NADA! E qual é diferença entre músicos, diretores e roteiristas? É que os músicos têm o ECAD, enquanto os roteiristas e diretores não têm (e já manifestaram que não querem ter nada parecido). O que o ECAD está fazendo é advogar em causa própria, é tentar manter, com a ajuda de uma lei ruim (tanto na teoria quanto na prática), uma situação privilegiada.
 
A atual Lei dos Direitos Autorais tem que mudar. E respeitosamente pergunto: será que a Superintendente Executiva do ECAD, considerado o argumento por ela mesma exposto – que a proteção deve atingir “todos aqueles que contribuíram com suas criações individuais para o nascimento de uma nova obra, e não apenas os compositores e músicos” – concorda comigo? Espero que sim. Uma lei absurda e não-ética deve ser mudada. Uma lei que exclui – na teoria ou na prática – categorias importantes de criadores deve ser refeita. Se ela e o ECAD não concordam, gostaria de saber porquê.
 

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